A obra existencialista e digna de cinema, assim eu poderia descrever Enterre Seus Mortos de Ana Paula Maia, lançado pela editora Companhia das Letras. O livro é construído como uma novela, romance filosófico e pitadas de velhos Westerns de horror. Ana Paula trás uma visão sobre o social e ainda que não descreva que essa história se passe no Brasil é impossível não nos remeter a esse País onde a desgraça caminha ao lado da fé desesperada dos homens.
Sinopse.
Edgar Wilson é “um homem simples que executa tarefas”. Trabalha no órgão responsável por recolher animais mortos em estradas e levá-los para um depósito onde são triturados num grande moedor. Seu colega de profissão, Tomás, é um ex-padre excomungado pela Igreja Católica que distribui extrema unção aos moribundos vítimas de acidentes fatais que cruzam seu caminho. A rotina de Edgar é alterada quando ele se depara com o corpo de uma mulher enforcada dentro da mata. Quando descobre que a polícia não possui recursos para recolhê-lo, o funcionário decide rebocar o cadáver clandestinamente até o depósito, onde o guarda num velho freezer, à espera de um policial que, quando chega, não pode resolver a situação. Nos próximos dias, o improvisado esquife receberá ainda outro achado de Wilson: o corpo de um homem. Edgar e Tomás não se abalam diante da morte, mas conhecem a fronteira entre o bem e o mal, o homem e o animal. Por isso, os dois decidem dar um fim digno àqueles infelizes cadáveres.
Os personagens de sua história tem nomes muitos fortes o que é interessante pra essa escrita. Edgar Wilson mesmo a escritora em uma entrevista revela que o nome do personagem surgiu quando ela lia Edgar Allan Poe, para ser mais exato ao conto Willian Wilson. Então a autora pegou o Edgar do nome do escritor e Wilson do nome do personagem do conto e assim nasceu Edgar Wilson.
É em A guerra dos bastardos outro livro da autora que Edgar Wilson, surge pela primeira vez pra gente. Os trabalhadores dos livros de Ana Paula, não só nesse livro são trabalhadores que vivem a margem da sociedade. Brutos, sujos e invisíveis os trabalhadores desempenham papeis desde limpador de esgotos até removedores de animais mortos na estrada.
Em uma entrevista a autora diz que para adentrar em ambientes tão fora de seu contexto real ela precisava de Edgar Wilson, seria para ela impossível sem esse personagem tão forte.
E eu concordo, impossível não gostar desse personagem que ao mesmo tempo que carrega traços tão secos, um silêncio tão forte mas que ao mesmo tempo tem tanta empatia pela vida, ao mesmo tempo é tão observador e inteligente ao ponto de saber que na vida ganha mais quem escuta do que muito fala.
Ana Paula Maia nos entrega um livro que parece um roteiro de filme, a escritora já foi comparada a Quentin Tarantino e Takeshi Kitano pela violência abordada em seus livros. Na verdade eu acho exagero visto que a violência não é tão grande assim e visto que o que chamamos de violência em seu livro é totalmente diferente do contexto de violência relatada nos filmes dos diretores a qual ela é comparada.
Talvez, a sua escrita forte, sua violência e seu relato social seja mais justo ser comparado ao cinema do brasileiro Cláudio Assis. Lendo o livro me lembrei bastante do açougueiro de Amarelo Manga o personagem Wellinton Kanibal vivido pelo ator Chico Díaz.
Como registrado no livro sabemos que a morte exige responsabilidades, a descrição de uma religião que se aliena, que escraviza e que apresenta a fé e o apego ao divino como unica solução no livro é bem construída. No fim o que se tem é ausência de Deus e de poderes legislativos.
No fim sabemos que o ser humano carece de sorte até pra morrer, é tudo caótico, tudo triste e sincero demais na escrita da autora. É difícil compreender como uma pessoa que acaba de tirar o resto de um animal morto de uma estrada ou tritura animais em uma máquina fedendo vísceras, sangue e carniça consegue sentar em uma mesa e comer tão naturalmente.
Talvez o homem seja o que se tem de mais podre na natureza, esses mesmos homens se acham no direito de alguma ajuda divina. Encaram o céu a espera de um milagre enquanto Deus em sua infinita sabedoria sorrir sarcasticamente de todos seus apegos e angústia.
Assim os personagens dessa história seguem por estradas a procura de enterrar e trazer dignidade aos dois cadáveres que eles carregam na carroceria do carro. E nessa espécie de Road Movie o que eles encontram são descasos, pessoas sem caráter, ganância e mais e mais tragédias.
Enquanto Edgar Wilson segue sendo a razão, o silêncio e a observação o amigo Tomás segue sendo a fé, a paciência, a cumplicidade e compreensão necessária a Edgar. Tomás também tem seus demônios a serem exorcizados.
Vocês podem não acreditar, achar que é exagero de minha parte mas a cada descrição direta e seca da autora eu consegui além de ver a minha frente os cenários de suas tragédias sentir o cheiro de cada sangue, de cada comida, de cada poeira deixada pela estrada.
Duas coisas eu achei extremamente muito bem criada na história da autora, a primeira é como descobrimos o contexto do nome do livro e a segunda as duas situações de acaso que surge em determinado momento do livro, situação que para saber vocês serão preciso prestigiar essa obra da autora.
Por fim posso dizer que essa foi minha primeira leitura da obra da autora nacional, e posso dizer que pretendo ler com bastante atenção mais de seus livros. É por autoras como Ana Paula que acredito que a literatura brasileira é a melhor do mundo, é por livros como esse que tenho a Companhia das Letras como minha editora preferida de todas.
E você, já leu este livro? Qual foi sua experiencia com ele? Já leu algum outro livro da Ana Paula Maia? O que achou?
Vamos conversar nos comentários.
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